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A menor distância entre dois pontos

Em 2002, quando Lula venceu a eleição, temi pelo pior. Temi que o país se fechasse ou que a sociedade civil ficasse refém das ameaças do MST.

O fato é que Lula conduziu uma política econômica ortodoxa, aquietou o MST e pouco ou nada fez para destruir a normalidade democrática. 

Sim, eu sei o que vocês pensaram. Porque também pensei e ainda penso: o Mensalão foi um jeito de sabotar a democracia.

Ora, se o representante eleito está a soldo de um partido, ele representa o partido e não o voto de quem o elegeu. Estamos de acordo. Mas o esquema foi revelado e metade da cúpula petista foi presa.

Quem desbaratou a tramoia foi o ministro Joaquim Barbosa, indicado pelo próprio Lula. Isso significa alguma coisa. Isso significa muita coisa.

Pois o petista se reelegeu e manteve a nau na mesma direção, ainda que a qualidade do governo diminuísse. Mais dificuldades econômicas, mais populismo assistencialista, mais acirramento do discurso e, por fim, uma péssima ideia: apontar Dilma Rousseff como sucessora.

Dilma, que não é má pessoa, foi péssima gestora. Escolhas macroeconômicas equivocadas, capacidade de governar insuficiente, dificuldade em estabelecer diálogo. O que começou ruim, terminou pior com a reeleição.

Reeleita, tinha os dias contados. O PT também. Com a operação Lava Jato, Dilma sofreu impeachment e Lula foi preso.

Nas municipais, o Partido dos Trabalhadores foi varrido do mapa eleitoral.

Na presidencial, Fernando Haddad aceitou participar de uma corrida farsesca, cujo fim nós sabíamos onde iria dar. Deu em Bolsonaro.

Lula e o PT tiveram culpa. Primeiro, porque produziram corrupção e recessão. Segundo, porque não quiseram perceber o que estava em jogo: Bolsonaro se alimentava do antipetismo visceral.

Se o PT, em 2018, abrisse mão da candidatura e desse apoio a outro – Ciro? Marina? –, talvez o bolsonarismo perdesse razão de ser – e perdesse votos. 

Fui e continuo crítico do que Lula e o PT propõem. O lulopetismo se agarra ao Estado e submete a política ao populismo eleitora. Acredita estar acima da crítica e abaixo do radar ético. Sufoca a emergência de uma esquerda renovada.

Seja como for, em retrospectiva, reconheço que meu maior temor não se justificava. Errei no prognóstico. Lula entrou e saiu, Dilma entrou e saiu. Dilma sofreu impeachment. Lula foi preso. A democracia não foi seriamente abalada.

O “comunismo” petista tem mais em comum com os banqueiros que com os guerrilheiros. O Brasil não virou ditadura.

Ironicamente, nunca esteve tão perto de virar. Jair Bolsonaro ameaça diretamente a democracia desde o primeiro minuto de seu mandato. Aliás: desde o primeiro minuto de qualquer mandato para o qual tenha sido eleito. Democracia, para Bolsonaro, é um jogo cujas regras ele não aceita.

Agora, às vésperas do segundo turno, escancara o que sempre esteve claro: se puder, acaba com a baderna democrática.

Ao dizer que, reeleito, proporá ao Congresso – um Congresso majoritariamente reacionário e venal – a mudança na composição do Supremo, o presidente assume de vez que não quer ser mais presidente. Quer ser outra coisa. Sem adversativas. Sem abstrações. Sem segundas intenções, só mesmo as primeiras. As de sempre.

Compreendo quem, ainda assim, hesite ou mesmo não queira votar no Lula. Mas que vote nulo. Não compreendo quem não hesite e queira votar no Bolsonaro. Bolsonaro não é um homem, é uma unidade de medida institucional. É a menor distância entre o Brasil e a Venezuela.

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