em Copa do Mundo

Diário (bem à distância) do Qatar #00

Vai começar a 22ª edição da Copa do Mundo de futebol, desta vez sediada num país que tem a justa fama de prezar pelos direitos humanos (quando os humanos são obedientes ao verdadeiro Deus), pela igualdade entre os homens (ressalvados os desobedientes ao verdadeiro Deus) e pela liberdade das mulheres (desde que obedientes aos homens obedientes ao verdadeiro Deus). A escolha, por sua vez, obedeceu ao verdadeiro deus da FIFA.

Como se vê nas empolgadas transmissões, o simpático país do oriente médio tem recebido a todos com festa. Pequenas e quase imperceptíveis restrições são as seguintes: é proibido ou pouco recomendável dançar, beber, fumar, pular, comemorar, informar, entrevistar, ser entrevistado, ser gay, ser mulher, jogar futebol, ganhar jogos, perder jogos, empatar jogos. Nada que macule o espírito esportivo.

Giovanni Infantino, presidente da FIFA, entidade das mais lisas e que sempre operou com lisura, criticou as críticas e declarou em coletiva que se sente um coletivo: “Eu me sinto árabe, qatari, africano, gay, deficiente…”. Justificativas? Há. Porque seus pais trabalharam em situações difíceis na Suíça (violinos, por favor) e porque, durante a infância suíça, ele sofreu preconceito por ser ruivo (entra o piano bem de mansinho).

Deixemos os pormenores pra lá. A bola vai rolar e, a não ser que a seleção equatoriana seja presa entre hoje e amanhã por qualquer irregularidade, como, por exemplo, treinar demais ou ingerir repositores hidroeletrolíticos, teremos muito futebol e é isso o que de fato importa. As tradicionais seleções de Qatar e Equador abrirão o torneio com as devidas honras. Marquem na agenda para não correr o risco de ligar a televisão no mesmo horário: domingo, 20, 13h de Brasília. Tem alguma festa de criança pra ir?

O Brasil é favorito. Acredito no título. E não porque, jogando num país que respeita os direitos fundamentais, se sinta jogando em casa, mas porque, gostemos ou não, é o time que jogou melhor no ciclo da Copa. Tite, que soube montar um sistema defensivo coeso e um meio de campo organizado, teve a sorte de, nos acréscimos da preparação, contar com a explosão de vários talentos criativos e provavelmente decisivos como há muito não víamos.

Paquetá, Neymar, Vinicius Júnior, Antony, Rodrygo, Raphinha, Richarlison, Pedro, Gabriel Jesus e Gabriel Martinelli formam o conjunto mais talentoso – e efetivo – desde o título de 2002. Sim, vocês pensaram: “Ficou louco? E o time de 2006?!”. Bom, aquilo era um conjunto de exibicionistas, não um time. Aquele foi um exemplo de como não basta distribuir as camisas e esperar que o artista resolva. A não ser que o artista seja Zinedine Zidane.

Argentina vem forte e é a última tentativa de Messi, que fará milagres. Também última será (talvez partindo no banco) a tentativa de Cristiano Ronaldo, e Portugal tem jogado bem sem ele; melancólico encerramento. Dinamarca, Bélgica, Croácia? Bons times, mas não creio numa Copa de surpresas. França chega mal: perdeu Pogba, Kanté e pode perder (todos perderíamos) Benzema. Espanha é jovem e será favorita à próxima; nesta, se surpreender, me surpreenderá. Alemanha é favorita porque Alemanha é favorita. Uruguai? Forte, há brilho, há elenco. Holanda é minha segunda seleção de sempre, mas não aposto um bitcoin desta vez. Inglaterra? Inventaram o futebol moderno e esqueceram como é que se joga. A Premier League só é a primeira liga mundial porque quase não há ingleses nos principais times.  

Os outros são os outros e só.

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