em Copa do Mundo, futebol

Diário (bem à distância) do Qatar #12

Pouco tempo depois dos inesquecíveis 7 a 1, com os quais os alemães açoitaram o orgulho pátrio, foi publicado no Brasil, pela editora Grande Área, Gol da Alemanha, livro de Axel Torres e André Schön, que pretendia explicar – e explica – as razões do sucesso do futebol alemão. Mais do que o sucesso, a transfiguração estética desse sucesso: de uma seleção pesada – em mais de um sentido – a uma seleção pesada apenas na camisa. Com organização, investimento na base, intercâmbio, conhecimento e profissionalismo, o futebol-força virou o futebol-arte que a obscena goleada de 2014 simbolizou. Por aqui, especialistas e palpiteiros (que às vezes se confundem) decretavam que, pelos mesmos motivos, o futebol nacional revirava latas, revivendo um antigo complexo. O diagnóstico não estava errado: o futebol moderno precisa, sim, de tudo aquilo que na Alemanha se faz e no Brasil não se faz; pior – se faz ao contrário. Porém, estamos falando de futebol e não da fabricação de automóveis. Nos dois mundiais seguintes, os insuperáveis alemães foram superados na 1ª fase. O que, enfim, tudo isso quer dizer? Quer dizer que, à parte a organização, o investimento, o intercâmbio, o conhecimento e o profissionalismo, o futebol é, dos esportes coletivos, o menos previsível. O menos domesticável. Existe nessa anárquica disputa mais do que aquilo que se pode prever ou controlar. Seja uma jogada individual, seja uma falha do goleiro, seja um “apagão” como o brasileiro, qualquer coisa pode mudar a sorte dos grandes e o azar dos pequenos. Num esporte que não parece esporte, em que os pontos em disputa são poucos e os erros são muitos, as probabilidades são menos prováveis. Japão e Marrocos têm méritos e mereceram continuar, Alemanha e Bélgica têm méritos e mereceram voltar, e o público, que insiste nesse drama que vira comédia e vice-versa, mereceu o que viu. Espero que, como os brasileiros em 2014, os alemães tenham aprendido hoje, com o orgulho açoitado, que “os deuses vendem quando dão/ compra-se a glória com desgraça/ ai dos felizes porque são/ só o que passa”.

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