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Natal de Herodes

Peço que o poeta, tradutor e crítico literário Wladimir Saldanha me empreste o título de seu livro (que, aliás, recomendo) para falar de coisas intranscendentes.

Sou cristão, sou católico. Sobretudo, sou um mau cristão e um mau católico. Não sou exemplo pra ninguém.

Sou Pedro – nego uma, duas, três vezes. Sou Tomé – preciso ver, tocar, cheirar. Sou Judas – traio por menos de trinta moedas.

Minha pretensão é admitir que sou o que sou, que devo o que devo, que falho o quanto falho: como São Dimas, na tradição católica, o “bom ladrão”. Eu mereço. Ele não merece.

Elas não merecem: as crianças de um país que não parece ter um justo que o justifique no mapa.

O ministro da Saúde, Maurício Queiroga, já disse muitas coisas escandalosas. Mas a proximidade do Natal lhe trouxe nova inspiração.

Na última entrevista, ponderou que não há motivo para alarme, já que o número de crianças ceifadas pela covid ainda é baixo. Está no patamar esperado.

Depois de mais de 600 mil mortos no Brasil, depois da aprovação da vacina, ele faz as contas da quantidade razoável de óbitos infantis que serão necessários para despertar sua atenção.

Não se trata, portanto, de inviabilidade logística ou desaprovação científica. Temos os meios e temos os remédios. Não temos vontade de vacinar as crianças.

Dias atrás, eu conversava com um amigo cristão (reformado). Temos diferenças e semelhanças, mas nos entendemos.

Papo vai, papo vem, ele hesitou, eu hesitei, por fim concordamos no essencial: este governo é a inversão de tudo o que se sabe ou se imagina cristão. É um governo fundamentalmente anticristão.

Que fiéis de quaisquer denominações ou tradições ignorem isso é desanimador.

Entre Jesus e Herodes, o governo Bolsonaro fez sua escolha. Muitos acreditaram e acreditam num falso Messias.

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