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Orçamentarismo de coalizão

Charles-Louis de Secondat, Barão de Montesquieu – só Montesquieu, para íntimos como Arthur Lira –, é o filósofo que cometeu a tese da divisão do poder em funções distintas, uma teoria da separação dos poderes que virou fundamento (ou pretexto) das constituições modernas.

Linhas bastantes gerais, o francês propôs que um governo legítimo exerceria o poder de maneira repartida: legisladores legislam, executivos executam e, por fim, juízes julgam. Cada um no seu quadrado institucional, sem se meter indevidamente no quadrado alheio. Montesquieu não contava com o Brasil.

No Brasil, seja em tempos de ditadura, seja em tempos de democracia, o legislativo executa, o executivo julga, o judiciário legisla – e todas as outras combinações são possíveis. É tudo tão misturado, confuso e emaranhado que a gente quer criticar um e acerta a crítica no outro; quer condenar o outro e condena o um; quer censurar o mau comportamento de ambos e acaba censurando o bom comportamento do terceiro.

Vejam em que está metido o PT. Quando governou, no primeiro mandato, Lula botou uma parte considerável do Congresso no bolso ao botar uma parte considerável no bolso do Congresso. Esse arranjo pela “governabilidade” foi chamado de mensalão. Parte da cúpula petista desabou, mas Lula saiu ileso.

Ironia, o mesmo Lula herda do governo Bolsonaro uma espécie de mensalão em escala industrial, devidamente aprovado pelo Congresso, que comprometerá os próximos anos e, dupla ironia, servirá de chantagem contra qualquer tentativa de independência do Executivo. É uma bomba fiscal que Lula não sabe desarmar, mas, sobretudo, não sabe se quer ou não quer desarmar. Na dúvida, resolveu apoiar a reeleição do hábil chantagista, retifico, negociador que preside a Câmara.

Governe-se com um barulho desses. A solução, é evidente, não está numa intervenção militar, no impeachment de ministros ou na prisão de opositores. A solução, seja qual for, ainda que imperfeita e provisória, estará na política. Mas, sob o peculiar arranjo brasileiro, o “orçamentarismo de coalizão” atravanca, complica e submete o país a interesses dos quais o país sequer desconfia. Arthur toca lira enquanto Brasília pega fogo.

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