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Quem semeia Ustra, colhe Moraes

O debate público brasileiro tem sido feito em linguagem privada. Na impossibilidade de compreender e se fazer compreender, topamos conversar com quem nega as condições mínimas de qualquer conversa política.

Por exemplo, a premissa de que o resultado das urnas tem de ser reconhecido, a não que se apresentem provas inapeláveis de fraude. Você ganhou, você perdeu, faz parte do jogo e é bom que seja assim. Mas nem todo mundo acha bom.

O bolsonarismo é um movimento golpista porque Jair Bolsonaro é um político golpista. Ele nunca negou. Participa do jogo mas coloca em dúvida suas regras. Sua ficha-corrida de declarações, ameaças, atos e omissões é extensa e suficientemente conhecida.

A manifestação do último domingo, orquestrada por ideólogos, financiada por empresários e inspirada por políticos, foi a mais escandalosa tentativa de se consumar um golpe de Estado desde 1964.

Se Brasília tivesse caído, a história seria uma. Como não caiu, a história será outra. Um golpe frustrado é pior que golpe nenhum. A reação viria forte, e veio.

Poderíamos discutir demoradamente as minúcias jurídicas e os desdobramentos políticos da colisão – e da confusão – entre os poderes da República. Deveríamos ter espaço na agenda para debater os trancos e solavancos do STF.

Mas a extrema-direita não deixa. Acusar os perigos de uma certa “ditadura da toga” seria motivo de aplauso, e eu mesmo aplaudiria em pé, se quem acusasse fosse democrata sem adversativa. Acontece que não é assim.

Quem mais reclama do voluntarismo de Alexandre de Moraes é quem defende uma Corte biônica, um Congresso passivo, uma imprensa domesticada. Quem mais reclama das prisões é quem garante que “no tempo da ditadura foi melhor”.

Eu sinceramente não sei o quanto se pode ou se deve quando intelectuais pregam guerra civil ou intervenção militar. Censura? Processo? Permissão? Boicote? Demissão? O conflito entre liberdade de expressão e poder estatal é dos mais intrincados na teoria política.

O que sei é que alguns dos nossos desejos não deveriam ser atendidos. Para o nosso próprio bem.

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